Da redaçãoAlexandre Albini
Sasha, John Digweed, Dixon, Hernan Cattaneo, Tale of Us, Guy Gerber, Guy J, Amê, Laurent Garnier, Gui Boratto, Sebastien Leger, Stephan Bodzin, Robert Babicz e Solomun… O que estes nomes têm em comum? Nos últimos anos esses artistas, e seus respectivos selos, têm sido verdadeiros embaixadores das sonoridades melódicas e progressivas. Mas como classificar esta sonoridade que está invadindo o mainstage dos principais festivais do circuito, como Awakenings, DGTL, BPM entre outros? Seria techno melódico? Progressive house? Techno progressivo? Ethereal techno? Deep house? Electronica?
Um DJ iniciante, ou alguém que começou a curtir música eletrônica a partir desta década, pode ter dificuldade em identificar o que é o verdadeiro progressive house, principalmente devido a inúmeros equívocos de classificação do Beatport (leia a matéria sobre as mudanças de classificação do Beatport AQUI, para entender melhor). Caso você se encaixe nesse perfil, pode estar se perguntando: “Progressive house não é o estilo produzido por Alesso, Avicci, Kaskade, Hardwell, Steve Angelo e companhia?”
Pra quem sempre acreditou que o “EDM*” incluía as sonoridades do progressive house, viemos avisar que a história é um pouco diferente. Para entender melhor é importante saber o porquê da palavra ‘progressive’, que vem da entrada gradual de elementos. Em uma faixa real do estilo, os synths, percussões, arpegios e melodias vão entrando lentamente, construindo uma história longa e hipnotizante. Já nos ritmos de ‘EDM’, as faixas são baseadas em breaks longos e grandes drops, sem progressão.
*Não confundir “EDM” com “Electronic Dance Music”, termo que ao pé da letra abrangeria todos os gêneros, mas que foi cunhado nos Estados Unidos no final da década de 2000 para abranger as novas sonoridades explosivas de big room e afins que invadiram os grandes festivais, quando produtores de eventos deste país resolveram entrar no jogo bilionário da indústria de música eletrônica.
DA ONDE VEIO ENTÃO O PROGRESSIVE HOUSE
No final dos anos 90 as raves e clubs do mundo eram dominados pelos sons high bpm do trance e do techno, até que um movimento liderado por Sasha e John Digweed começou a introduzir uma sonoridade que trazia grooves mais refinados da house music, com as melodias do trance. Trocava-se assim o frenesi dos big drops pela viagem introspectiva e espiritual do prog house. Não tardou para os dois artistas se tornarem DJs número 1 do mundo no início dos anos 2000, confirmando o ápice de popularidade do estilo no circuito.
Sasha – Xpander – Uma das faixas mais icônicas de Progressive House da história.
Porém, a música eletrônica estava em processo de massificação, começando a invadir as rádios e charts mundiais. Com esse novo mercado radiofônico formado no mundo, o prog house ficou restrito ao ambiente raver e clubber. Por volta de 2008, o estilo começou a sofrer uma forte descaracterização em razão do Beatport permitir que as gravadoras e artistas escolherem livremente a classificação das músicas. Passou-se a misturar as sonoridades do house tribal e electro house com os synths e melodias imponentes do epic trance e do euro dance, deixando o prog house sem uma real referência no site.
Já no final dos anos 2000, o estilo começou a sofrer uma descaracterização forte porque o portal Beatport deixou as gravadoras e artistas escolherem livremente o gênero de suas músicas. Artistas passaram a misturar as sonoridades fortes do house tribal e electro house com os synths e melodias imponentes do epic trance e do Euro dance, criando uma sonoridade totalmente nova. Sem ter um gênero específico, começaram a lançar como “progressive house”. E aí ele veio a se tornar o mega popular “EDM” e “big room”, que se apropriou do termo no início desta década, deixando o verdadeiro estilo underground perdido, sem uma real referência no portal Beatport.
E ONDE FICOU O “REAL” PROGRESSIVE HOUSE NESSA HISTÓRIA?
Continuou vivo, mas apenas em circuitos específicos, representado com força por artistas como Hernan Cattaneo, Nick Warren e Guy J. A dificuldade de achar tais faixas era imensa para DJs do underground, que pararam de fazer suas pesquisas na página de prog house devido à invasão da “EDM”. Parecia que a vertente jamais viria a se popularizar novamente, já que o techno, minimal, deep house e tech house haviam dominado o circuito “underground” e seus principais artistas no início da década, como Luciano, Richie Hawtin, Loco Dice, Seth Troxler, Ricardo Villalobos, entre outros, que eram – de certa forma – avessos aos elementos e melodias do progressive.
O “SALVADOR”
Porém, no início da década, Dixon começou a chamar a atenção do público por apresentar uma sonoridade inovadora. Diferente dos seus pares, passou a hipnotizar as pistas com sets melódicos e introspectivos, com arpegios, pads, baixos corridos e harmonias complexas. Um som até então novo para um público que não tinha contato com estes elementos musicais. Essa ascensão foi fulminante e o artista apareceu em 2013 pela primeira vez como número 1 do Top 100 DJs do Resident Advisor e desde então não saiu mais dessa posição do ranking. A partir disso, artistas de destaque passaram a adotar os elementos e melodias do progressive em seus sets.
Dixon tocando ‘Chicola – Childhood’ no main Stage do Awakenings – Faixa lançada pela gravadora ‘Lost & Found’ de Guy J.
Podemos citar Solomun, o selo Diynamic e Tale of Us como um dos primeiros a abraçar com força a sonoridade e ajudar nessa expansão. A onda melódica/progressiva se espalhou definitivamente em meados desta década, com selos renomados de outros gêneros como Noir e Suara lançando inúmeras fusões de progressive com tech house, deep house e techno.
Tale of Us e toda sua progressividade tocando “Fatima Yamaha – Araya.
Como era praticamente impossível ter alguma visibilidade lançando sons conceituais na página de progressive house do Beatport, os selos começaram a soltar os releases como techno, tech house, deep house e electrônica. O Beatport – vendo o real prog house ficar cada vez mais forte, enquanto a “EDM” ia perdendo popularidade –, resolveu, no final de 2016, devolver a verdadeira sonoridade a categoria. Artistas como Hardwell, Alesso, Avicii, Axwel e similares foram removidas da seção, sendo recolocados em suas devidas vertentes, incluindo big room, dance, electro house e future house.
PROGRESSIVO E TECHNO = UM CASO DE AMOR
O ciclo se fechou, e gravadoras e artistas que antes lançavam as sonoridades “progressivas” camufladas em outros gêneros puderam voltar a categorizá-las como tal. Assim, este estilo finalmente voltou a ser chamado do que realmente é. Hoje é praticamente impossível ver um artista importante de techno não incluir alguma faixa de prog house em seus sets e vice-versa.
Maceo Plex no Boiler Room tocando ‘Der Dritte Raum – Hale Bopp’ , clássico do Progressive.
Essa crescente popularidade pode ser facilmente percebida olhando para algumas playlists, flyers e charts. John Digweed e Sasha são os headliners do Resistance, marca conceitual do Ultra e que estão ditando o ritmo da residência oficial da marca em Ibiza. Artistas referência em outros estilos como Cristoph, Patrice Baumel e Victor Ruiz carimbaram recentemente o Top 1 de prog house – e é comum ver nos sets de Solomun, Tale of Us, Dixon e Ame faixas de artistas como Pryda, Darin Episilon, Quivver, Petar Dundov, Glenn Morrison, entre outros.
E COMO O BRASIL ENTROU E SE ADAPTOU A ESTE NOVO CENÁRIO?
Sempre tivemos artistas e apostas por aqui, mas alguns clubs e produtores de eventos voltaram a investir fortemente no estilo que está mais presente do que nunca. O UMF Rio confirmou Sasha e John Digweed na edição desse ano; Warung (com Dixon, Mano Le Tough e Hernan Cattaneo frequentemente nos line ups) e D-Edge confirmaram Guy J e Guy Mantzur para serem headliners de festas importantes.
Referências de progressive house no exterior, Morttagua e Danny Oliveira estão conquistando maior espaço no cenário nacional, e com eles outros artistas vêm surgindo e se destacando como Nato Medrado, Luciano Scheffer, Fer J e Be Morais. Blancah e Alex Justino, artistas que representam o “techno melódico”, vêm ganhando mais força dentro do casting da agência D-Edge, e a Entourage anunciou L_cio como uma de suas grandes apostas para 2017. Além disso, vale destacar selos nacionais como D.O.C, Timeless Moment, Not Another e Nin92wo.
Ou seja, os sons progressivos e melódicos já começam a sair dos círculos dos grandes artistas para entrar nos cases dos DJs de menor expressão, aqueles que movimentam as cenas locais com festas e residências em clubs. Não importa qual o seu rótulo preferido, e sim que que as sonoridades progressivas estão em alta e prometem ser a grande tendência no circuito underground mundial em 2018. Será que isso vai pegar de vez no Brasil também? Fiquemos atentos aos próximos capítulos!